O PERTENCIMENTO DOS CORPOSAcesso, de Julia Leite

por Giovanna Barbosa

“Tem CEP que me sabe, outros que não me cabe”. A frase já nos impacta logo no início de Acesso, uma frase que possui um peso enorme em cima de corpos que não seguem a heteronormatividade. O ser humano nasce em busca do sentimento de pertencimento, queremos nos sentir parte de um todo apenas sendo nós mesmos, e quando se vive em um mundo que muitos espaços te rejeitam, essa busca se torna muito mais complexa. O filme de Julia Leite torna pública a história dessas pessoas que acharam ou que ainda buscam seu lugar de pertencer.

Pessoas LGBTQI+ trazem relatos sobre seus corpos e o espaço em que habitam na cidade de São Paulo, mesmo após séculos de luta, o direito de frequentar e ser respeitado em qualquer local público ainda não conquistado. Segundo Filipe Fontes, que expõe a história de quando precisou se locomover até um lugar longe de sua casa para poder mostrar afeto ao seu parceiro publicamente: “a rua é a mesma, mas ela é feita por outro tipo de pessoas”. E mesmo com essas pessoas querendo apagar a presença desses corpos, precisam lembrá-las constantemente que a definição de ambiente público é de uso comum e posse de todos.

“Entender o meu corpo ocupando qualquer espaço como corpo que educa.” É um dos trechos de um relato que fala sobre se fazer presente em ambientes em que as pessoas geralmente não se relacionam com a comunidade LGBTQIA+, e só o fato de estarem aproveitando o momento e se divertindo faz com que outras pessoas se eduquem apenas por presenciar aquilo. A frase é muito impactante no meio de uma pandemia que os obriga a ficar em casa e deixar de ocupar espaços na rua, passando a ocupar espaços virtualmente. Acesso reforça a importância de a comunidade precisar marcar presença em todos os lugares, mostrar ao mundo que existem e que não vão aceitar acesso limitado às ruas.

Julia Leite, que possui a ficção Ainda Não em sua filmografia LGBTQIA+, agora dá voz a quatro pessoas queers, permitindo-as revisitar remotamente lugares em que experimentaram alegria e dor. Com muita sensibilidade, consegue fazer algo inovador. Utilizando o Google Earth, ela nos teletransporta para dentro de lugares em que a história acontece.Juntamente com a seleção de imagens e ambientação sonora, o CEP carrega uma carga emocional para as pessoas do curta e também se torna especial para nós espectadores, mesmo sem nunca termos visitado esses lugares.

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