2 Brasis com Z sobre 2 Brasis, dirigido por Carol Aó e Helder Fruteira
Por Lourenço Brito
“A Invenção do Brasil” é a frase que nomeia a Mostra Brasil 8, da 35ª edição do Kinoforum – Festival Internacional de Curtas de São Paulo. Os filmes presentes nessa sessão dialogam sobre a formação histórica do Brasil e sobre como um passado cheio de injustiças nos leva a um presente coberto de mediocridades. Para encerrar essa mostra, a curadoria optou pelo curta-metragem 2 Brasis, de Carol Aó e Helder Fruteira.
A narrativa se passa em um mundo distópico no qual o Brasil, refém de disputas ideológicas e culturais entre suas próprias regiões, é dividido em dois: o Brasil do Norte e o Brasil do Sul. Em meio a essa divisão, a revolucionária Estrela (Thainá Duarte) precisa atravessar a rígida fronteira para continuar sua luta em prol da unificação dos dois países.
O filme inicia com uma montagem dinâmica que alterna entre notícias de jornal ficcionais, vídeos ao estilo found footage e imagens com efeitos tecnológicos exagerados, que remetem às características introduções de séries policiais americanas. Através dessa montagem que vai direto ao ponto, o espectador é inserido no contexto desse mundo distópico.
Em seguida, somos apresentados às locações em que a ação irá ocorrer, espaços distópicos criados de forma esplêndida em termos de sua caracterização artística. O sinistro posto de fronteira, o simples e animado boteco localizado no Brasil do Norte e a extensa muralha, criada artificialmente na pós-produção, são perfeitos. Perfeitos até demais.
Em 2 Brasis, tudo parece artificial. O cuidado por um aperfeiçoamento estético e a vontade de impressionar o espectador, por meio de uma produção de “alta qualidade”, afasta a oportunidade de um maior aprofundamento narrativo. Isso também compromete a conexão do público com a trama, algo essencial ao colocar a prova um conflito já conhecido no contexto nacional. Esses dois Brasis se tornam distantes: um país qualquer, estrangeiro, de forma que seu conflito já não tem nada a ver com o conflito político, cultural e regional brasileiro, que presenciamos tão fortemente durante as eleições de 2022, na polarização entre um norte majoritariamente lulista e um sul majoritariamente bolsonarista.
Toda gama narrativa é afetada por essa escolha. Os personagens se tornam caricaturas de arquétipos hollywoodianos, rasos e desinteressantes. Estrela, personagem cujas ações levam o filme para frente, fica em segundo plano na maior parte do tempo, e só recebe seu devido protagonismo no final, trazendo uma mensagem sobre unificação e união dos povos dos dois Brasis — fala que, apesar de emocionante e bela, se torna supérflua ao dizer o óbvio.
Como é possível discutir uma questão essencialmente brasileira se, mesmo através da arte, procuramos fugir para a linguagem de um outro país? Nesse sentido, 2 Brasis apresenta uma temática interessante e um enorme potencial narrativo, mas se perde em sua insistência de tentar ser um filme de Hollywood.
Biografia: Lourenço Brito é estudante de cinema na Fundação Armando Álvares Penteado, onde já participou da produção de dezenas de curtas-metragens passando pelas mais diversas áreas. É apaixonado por cinema e cultura desde criança, tendo sido durante 2020 e 2021, redator e gerente do Cineclube Viva.