AS BATALHAS DE SÃO CARLOS
Pedra no sapato
O documentário “As Batalhas de São Carlos”, dirigido por Adriana Caren Cassin Duz e exibido no programa Cinema em Curso Petrobras 2, relata o movimento cultural do hip hop em São Carlos (SP) e a ocupação de uma casa abandonada para a formação da Casa do Hip Hop Sanca.
Batalhas de rappers aconteciam ali. Era um lugar abandonado, onde havia tráfico de drogas e prostituição. Porém, o projeto de revitalização estendeu-se para além do planejado, com oficinas de DJ, MC, grafitti, break, reforço escolar, cursinho preparatório para o ENEM, oficina de gestão de carreira artística, oficina de fotografia, oficina de reciclagem e reaproveitamento de materiais, entre outras atividades. O espaço também era muito voltado para o público infantil, transformando-se em um centro cultural.
Quando essa informação chegou aos ouvidos da Prefeitura Municipal de São Carlos, o então centro cultural de lazer passou a ser a pedra no sapato das autoridades. Por quê? Por preconceito? Afinal, o lugar abandonado havia anos antes da ocupação, que era para ser um Centro de Idosos, só foi requerido em 2014, ano em foi ocupado. A pergunta que não quer calar: por que coincidências infelizes como essas ocorrem no Brasil em questões políticas, sociais e culturais?
O filme não ficcional também nos traz outras reflexões, e não somente culturais, como a mulher no universo dos rappers. Em uma das batalhas de hip hop entre homem e mulher, nota-se o apelo verbal gordofóbico constante nas rimas, como um desespero oculto. Isso me parece um complexo de inferioridade inconsciente.
Em depoimento, Karluz Magum — cordenadora do projeto ao lado de Sara Donato –diz que existe muito machismo dentro do hip hop. “Não adianta lutar contra uma opressão sendo opressor.” Deparamo-nos com essa verdade na medida em que nos imergimos no mar rumo ao oceano de pontos de vistas equivocados, para naufrágio da sabedoria, oceano adentro sem mais visões, emergindo os equívocos, boiando então o preconceito e, ao olhar o espelho, a alma grita já tardia à realidade.
Em entrevista, Adriana Caren Cassin Duz fala sobre o enquadramento das luzes da cidade ao término do documentário. “Vejo como e agora o que vai vir? Parece que as luzes apagaram e acabou!” Adriana brinca com o foco da câmera para simbolizar o que ela deseja passar.
(Vanessa Karina de Oliveira)