Mistura de linguagens no trato à intimidade
Memórias Externas de uma Mulher Serrilhada, de Eduardo Kishimoto, encerra a Mostra Brasil 10. Um sessão repleta de escracho, nudez e sexo.
Entre ver e ser visto, muitas câmeras revezam os olhares sobre Josie, a personagem central do filme. A câmera fotográfica de sua amiga, a câmera de vídeo do ex-namorado, a webcam da própria Josie, a tela de um site pornô, o celular de um cliente da loja onde trabalha ou da multidão da rua Santa Ifigênia, em São Paulo.
Rua não menos simbólica que o próprio quarto da personagem. Entre o privado e o público, o filme configura “fragmentos digitais da intimidade de Josie” (como define a sinopse), sejam eles registrados por ela mesma, por pessoas próximas ou por qualquer desconhecido.
Em uma confusão de câmeras e telas, um drama muito contemporâneo se passa. O site Vazou na Net publica o vídeo dela transando com o ex-namorado. Ele é repassado para outros tantos sites e visto por um cliente da loja, que a insulta. Por um espetáculo qualquer, uma multidão de celulares se configura, como um julgamento em praça pública, mas ninguém acude a menina.
Fazer um vídeo já justifica que ele seja divulgado? Qual o trato que se dá para a intimidade quando passamos a viver em rede? A partir das diversas relações que se pode estabelecer com uma câmera, formamos uma geração de jovens com virais (vídeos), presenciamos casos desde a página de Isadora Faber, Diário de Classe, até situações extremas como a da personagem Josie.
Experimental e habilidosa, no filme de Kishimoto, é a própria maneira de filmar o argumento.
Luiza Folegatti
Esse filme faz parte de uma sessão (Mostra Brasil 10) recheada de filmes fortes e corajosos, daquelas que o falecido Reichenbach aplaudiria. Esse filme é um tapa para consciências que vivem nesses tempos digitais.Realmente o maior mérito é filmar emulando os próprios meios que critica, mostrando a sociedade interligada e o estrago humano que não “vaza” na net.