NUNCA É NOITE NO MAPA

Conexão para o real a partir do imaginário

Exibida na Mostra Brasil 4, a produção pernambucana “Nunca é Noite no Mapa” é exemplo dos novos modos de fazer cinema.

O curta de Ernesto de Carvalho repercute a reflexão sobre o papel social dos novos aplicativos. Feito a partir de imagens do Google Earth, nos conduz a olhar essas imagens de uma outra maneira, apontando observações delicadas e sutis, e deixando literalmente que as imagens falem por si.

Abre-se uma conexão para o real a partir do imaginário. A virtualidade deixa de ser um escudo e um limbo para a neutralidade social. Ernesto de Carvalho, se utilizando do cinema, destrói uma espécie de simulacro criado pelo sistema, no sentido de nos colocar cara a cara com o necessário. O filme, conforme vai passando, nos abre portas ao olhar crítico e não mais passivo ao que se vê.

Somos levados pouco a pouco a diversas cidades do país, a becos, esquinas, avenidas, fazendo algumas vezes retrospectivas arquitetônicas entre passado e presente. O mapa retrata o real, mas com um véu que não nos permite enxergar pontos minuciosos que são espelhos virtuais.

Os rostos das pessoas são apagados, mas elas continuam ali, infinitamente. Retira-se a individualidade, a pessoalidade, sendo tudo um retrato ou uma paisagem. O diretor tira esse véu do mapa, expondo o mesmo — e a nós, como espectadores, a observar o não observável.

As mídias são rodeadas de camuflagens, seja nas informações ou nas próprias imagens. Cada recorte, cada clique num segundo certeiro pode mudar todo o entendimento de uma situação. O papel do Google Maps e do Google Earth é explorar e mostrar as ruas e caminhos, colocando a câmera como o olho do espectador. Nesse caso, não há clique, não há recortes. É uma imagem infinita.

O filme desconfigura e renova o uso do aplicativo, nos possibilitando ver além do próprio mapa. Intrigante, vai abrindo novas camadas. Com um texto muito bem escrito em voz over, o diretor nos apresenta as imagens como arquivos pessoais. É pessoal, pois ele está no mapa e passa a ser pessoal também para quem assiste.

Há também sérias críticas sociais, que dão forte intensidade a essas camadas do filme. Esse novo modo de fazer cinema, se utilizando de outros recursos e mídias, vem tomando mais espaços. “Nunca é Noite no Mapa” se aproveitou desses recursos e, numa medida exata e com uma trilha sonora bem escolhida, nos chama a atenção para descobrir novos lugares e o que eles têm a nos dizer.

(Luiz Gonzaga de Souza)

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