Terror cotidiano
Tremor é um filme que depende muito da imagem de seu protagonista, sua inserção nos espaços gradativamente infernais em que percorre. Há, assim, uma grande centralidade na figura de Elon Rabin (que empresta seu nome ao seu personagem), ator que possui um perfil incomum para a tela de cinema – barba a fazer, cabelo grisalho e ondulado, fechados numa trança, os olhos pequenos e negros, a estatura baixa e passiva.
Descrevo-o assim pois o curta lhe observa de maneira a ressaltar sua fisicalidade, sua “couraça muscular” – a trajetória principal da narrativa se encontra aqui, na dramaturgia criada a partir da relação entre a câmera e as expressões corporais e faciais de Rabin; por vezes ficamos minutos sem enxergar seu rosto, há uma tensão em descobrir seus sentimentos. Trata-se de um homem em busca de um rosto e uma expressão, que lhe afague, drama que se acentua pela sua localização – Rabin está a caminho de um reconhecimento de um corpo que se encontra no subsolo do IML, local macabro, porém brutalmente banal, opressivamente real.
Com uma história que poderia seguir diversos rumos, é interessante pensar que uma das principais decisões estéticas e narrativas, aqui, seja o casting em si e o olhar instigante direcionado ao personagem. Tudo começa, aliás, com um rumo inesperado: um cavalo que caminha sozinho na cidade, como se estivesse perdido de seu dono; uma busca tal qual a de Rabin, mas cujas possíveis significações me escaparam numa primeira assistida – na cabeça, restou muito mais a ambientação delicadamente sombria do filme e o corpo de seu protagonista.
Encontrando o drama e sua fotogenia na frieza dedicada ao cruel cotidiano imposto a personagem, a abordagem do curta me pareceu muito em linha com uma série de curtas metragens brasileiros recentes, que dedicam-se a retrabalhar clichês de gêneros do cinema minimalisticamente, acentuando seu impacto através de uma tentativa de indistinção entre o drama (ou terror) cotidiano e o encenado, atenuando a ansiedade e a violência que existem nos espaços em que habitamos, nos rostos solitários que vemos de relance na rua. No caso, Tremor consegue tirar seu clímax a partir de um plano simples e próximo do rosto de sua personagem, com a qual dividimos uma revelação íntima e melancólica; na sala de cinema, é uma vitória.
Rodrigo Faustini
Tremor está na Mostra Brasil 2. Clique aqui e veja a programação do filme no Festival de Curtas 2013