Por dentro do desconforto sobre Nua por dentro do couro, dirigido por Lucas Sá

Por Larissa Armesto Snege

Com simbolismos e texturas, o curta provoca reflexão sobre sensações ambíguas. A fotografia é satisfatória ao olhar, pelos elementos alinhados e simétricos. Ideias sobre comida são ressignificadas: ora ligadas ao conforto e familiaridade, ora a imagens de faca, moscas e morte. O desconforto é gradualmente incitado, através do cenário desleixado.

Perguntando sobre inseticidas ao comprar carne, a protagonista de Gilda Nomacce revela que suas intenções e do curta não são óbvias. Cada vez mais
elementos estranhos são postos: mortes, facas e sujeira que, interpretados por uma fotografia com contrastes e de simetrias, transmitem um prazer estranho,
estimulando reflexão sobre a estranha atração e satisfação que o ser humano por vezes sente pelo grotesco.
A narrativa transita por essa ideia. A protagonista flerta com o esquisito: alimenta sua planta carnívora e limpa sujeiras sanguinárias sem repulsa. No clímax, ela sequestra uma garota através do bolinho, mutila-a e utiliza das partes para alimentar uma criatura misteriosa. Ela se delicia, esfregando-se no sangue e satisfazendo-se com os grunhidos da criatura, a sujeira, e a dor da vítima. Segundo a psicanálise, o ser humano tem um lado sombra que sente prazer com sofrimento. Mesmo que de modo inconsciente, submerso, e até negado, o prazer misto ao desconforto é parte da psicose humana.

O bolinho azul, cor escassa em alimentos na natureza, inspira a estranheza. Mas os confeitos remetem ao lúdico, trazendo inocência. E seu nome Céu Azul é quase um spoiler do final. Há humor de compensação sutil e brasileiro, um respiro em meio ao caos. “Você vende cupcake?” “Não, só bolinho”, falas que trouxeram risadas a
sala de cinema.

Um filme sensorialmente ambíguo: confortável e perturbador, como passar por um acidente e esticar o pescoço para ver mais. Leva o espectador à conexão com seu lado sombra e polêmico. Nua por dentro do couro nos provoca a despirmo-nos e entrarmos em contato com esse lado que nos torna humanos.

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