Um curta antes de um longa. Por que não?

A chamada “lei do curta” foi criada em meados da década de 1970 e previa a exibição de um curta antes de cada sessão de longa-metragem estrangeiro. Foi combatida ferozmente pelos donos de cinema e simplesmente descumprida (está em vigor até hoje, aguardando uma nova regulamentação). Explico essa situação porque é na época da “lei do curta” que se passa a história de “Tela”, de Carlos Nader.

Logo no início, um letreiro nos informa sobre a “lei do curta” e nos conta a história de um diretor fictício que teria feito um filme chamado “Inferno”, que consistia em 15 minutos de um plano único de uma sala de cinema com espectadores assistindo a um filme. Esse é o ponto de partida da história de Nader, que tenta discutir uma das leis mais polêmicas do audiovisual brasileiro.

De um lado, o público, que se vê diante de uma obra a que não escolheu assistir. De outro, os exibidores, que não querem dividir os lucros da bilheteria com os curta-metragistas, nem perder o tempo disponível para veiculação de filmes publicitários antes das sessões (até no cinema somos obrigados a assistir a alguém tentando nos vender algo). É claro que o curta de Nader não se aprofunda na questão e fica apenas com as reações do espectador, como se na tela estivesse sendo exibido um reflexo do que está ocorrendo. Usando o subterfúgio do sonho, o personagem principal acorda dentro do próprio sonho e se revolta com a exibição do tal “filme de gênio”.

Para além da revolta do público, é interessante que um filme de curta-metragem aborde de maneira descontraída e crítica uma lei antiga que caiu em “desuso” (é revoltante essa expressão). Uma situação que hoje não seria possível vislumbrar. Imaginem o sujeito querendo assistir a “Planeta dos Macacos” e antes da exibição se deparar com o curta “Ninjas”, de Denisson Ramalho (exibido no festival ano passado). Seria chocante.

Mas é claro que existem maneiras de selecionar e classificar os filmes para cada tipo de sessão; seria muito fácil colocar a lei do curta em prática. A realidade é que a má vontade governamental e do mercado de exibição impede que os curtas voltem a ser exibidos em circuito comercial. Seria muito melhor ver curtas do que a publicidade chata e repetitiva que somos obrigados a assistir, mesmo pagando ingresso. Ou seja, aos espectadores só resta o abuso. (Renato Batata)

“Tela” está na Mostra Brasil 6.

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