UM SONHO INEXPERIENTESomos Pequenas (México), de Fernanda Galindo

por Felipe Thomaz Fabris

À primeira vista, Somos Pequenas parece contar a história de uma cantora evangélica mexicana que mora em uma pequena vila e quer participar de uma competição de bandas, mas quer cantar rap e não músicas religiosas. A sinopse parece indicar um curta muito original, e com um plano de fundo que não costumamos ver: uma pequena vila no interior do México.

O curta começa com planos gerais de paisagens lindas e desertas no México. Chegamos a uma imagem aérea de uma cidadezinha e adentramos uma igreja, onde vemos uma jovem cantando. Ela estabelece olhares com uma outra jovem sentada, agora com planos próximos dos rostos delas. Saímos da igreja e o pastor entrega um papel para a cantora, uma divulgação do concurso de bandas. A cantora o apresenta para sua amiga e diz que gostaria de participar. Até então, todos os planos são lindos e com personagens que parecem interessantes: uma cantora com um relacionamento próximo com o pastor, uma competição de bandas, uma amiga que poderia ajudá-la a ganhar. Porém, o filme parece querer abordar todos os temas que a diretora tinha em mente e acaba fugindo de sua trama central.

Em todas as aulas no meu curso de audiovisual, meus professores sempre comentam que em nossos exercícios, quase sempre a realização de curtas, devemos nos manter focados em uma linha narrativa, sem mudança do foco e sem muita alteração nos personagens, justamente devido o tempo limitado que temos. Esse é o maior erro que Somos pequenas parece cometer. O pastor que nos foi apresentado logo de início nunca mais aparece; as amigas não discutem a competição de bandas; a diretora joga que a amiga da protagonista possui um relacionamento abusivo e por isso não pode ajudar nossa protagonista; a cantora tem um interesse súbito em rap – e que não parece afetar em nada sua vida na igreja; as duas amigas fazem uma apresentação para um casal de gringos, e isso nunca mais é retomado.

Ou seja, o fato de a cantora gospel cantar rap em frente de toda sua vila religiosa parece não ser um problema, mesmo que nós só tenhamos visto ela cantando músicas religiosas, e que tenha sido o pastor que recomendou que ela participasse da competição de música. A amiga da protagonista, que vive um relacionamento tóxico há anos, mal pode sair de casa, somente aos domingos para cantar para turistas gringos – mas, quando ela quer cantar com a amiga na competição, o marido não deixa. Ela, que vinha aturando o marido há anos e já disse que não poderia participar da competição, se vê numa maré de tristeza tremenda, e enxerga como única possibilidade de cantar no concurso o assassinato do próprio marido com veneno. Mesmo cometendo o assassinato, ela acaba não indo cantar com sua amiga. E após a vila saber desse assassinato, ninguém parece suspeitar da esposa, e a vida continua normalmente.

A diretora possuía um conceito em mente, um conceito bem adolescente de que uma jovem religiosa que sonha cantar rap em frente a toda sua cidade evangélica, e sua amiga em um relacionamento tóxico e proibida de cantar, iriam superar as adversidades para cantar juntas. Esse conceito não só não é explorado como também é deixado para trás. Tudo é apressado para que se chegue numa solução em 15 minutos, mesmo que para isso se tenha que abandonar personagens, não desenvolver as protagonistas e deixar diversos furos de roteiro para trás.

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