KILLING KLAUS KINSKI

O homem e a natureza

 

Lançado em 1982, “Fitzcarraldo”, do mestre Werner Herzog, é um belíssimo trabalho que enaltece, de forma poética, a relação do homem com a natureza, ao mesmo tempo em que busca compreender o que leva o ser humano a alcançar feitos que desafiam a própria magnitude em prol, muitas vezes, da arte.

Com uma qualidade técnica que impressiona até hoje, o filme também ficou conhecido, infelizmente, por uma produção conturbadíssima, em que pessoas morreram no processo, e levou a um aflicão imensa do cineasta com o ator principal, Klaus Kinski, a tal ponto que tribos locais considerarem matar o ator, uma vez que suas constantes explosões de raiva os incomodavam.

Buscando dramatizar esse acontecimento, o curta colombiano “Killing Klaus Kinski”, exibido na Mostra Latino-Americana 1, certamente é uma homenagem do diretor Spiros Stathoulopoulos, ao acompanhar o início das atribulações no set, a partir de uma picada de cobra em um dos membros da equipe, levando à amputação do seu pé (fato real, aliás), até a dificuldade de lidar com os indígenas em relação à insatisfação deles com Kinski.

O diretor demonstra um talento excepcional de conduzir a narrativa com um plano-sequência que praticamente toma o filme todo, numa maneira de exaltar a urgência de um problema que vai adquirindo grandes proporções. Muito mais do que isso, ele apresenta um cuidado de acompanhar todas as situações possíveis com câmera na mão, o que funciona como ponto de vista dos protagonistas da historia: os índios que participaram do filme.

Nesse aspecto, “Killing Klaus Kinski” é uma continuação das mesmas reflexões sobre a relação homem-natureza que tanto marcou a obra de Herzog, com o adendo de explorar a cultura e as crenças da tribo retratada com cuidado documental digno do mestre. Por sinal, o uso da narração em off do próprio Herzog é um detalhe brilhante para ilustrar os floreios e mistérios da força da natureza sobre o ser humano e como as tribos acreditam na própria capacidade de conseguir o equilíbrio necessário de convivência para respeitá-la.

Com um ótimo desenho de produção que retrata com precisão a época da ação, Spiros ainda demonstra um momento que beira o sublime de fazer jus ao próprio “Fitzcarraldo”, ao criar uma belíssima sequência que envolve a musica “Vesti la giubba”, da ópera “Pagliacci”, sem falar num senso de humor bem peculiar (quem ficar até depois dos créditos vai entender o que quero dizer).

(Marcelo Carvalho)

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