MUMBI 7 CENAS PÓS BURKINA

Fragmentação e diáspora na subjetividade negra

O título do curta “Mumbi 7 Cenas Pós Burkina” — produção paulista exibida no programa Mulheres Negras: Mergulho Ancestral é difícil de compreender à primeira vista. Pudera: trata-se de uma composição de significados fragmentados que só fazem sentido quando juntos, e que remete a cenas pós-diáspora negra. A diretora Viviane Ferreira consegue inserir, em todo o processo experimentalista cuja técnica domina, as angústias de uma personagem cineasta.

Isso está de fato mostrando que a própria diretora experimenta uma forte expressão subjetiva como autora, ao mesmo tempo em que se situa no mundo.

Essa situação, como já fora citada, é diaspórica. A sensação de estar em um lugar que não foi construído pra si, em um espaço que não é seu. A caótica montagem inicial pré-título situa as origens, o lugar inicial do espaço negro (talvez Burkina Faso?) cuja transição pelo rapto histórico criou esse lugar do meio na subjetividade negra, na época sem perspectiva, e hoje sem garantia de futuro.

Essas contingências situam a subjetividade da negritude brasileira num lugar de incertezas que faz muitos duvidarem de sua capacidade, de suas próprias intenções, de seu pertencimento em um local tão branco, tão elitizado como é o cinema. Do que a próxima obra irá falar? De arte cinematográfica ou do lugar de onde veio e do que quer passar? A arte como política é a boa crise que surge e condiciona o modus operandi da negra cineasta.

A trilha sonora experimentalista contribui para o tom da obra. Não alivia o sentimento em momento algum e mantém o lugar do meio pela técnica; há tanto o atabaque ancestral próprio das religiões de matriz africana quanto a tonalidade daquele som liso-progressivo de um teclado que explora internalidade, quase como que num devaneio ou reflexão profunda, só que advinda de um outro lugar.

Essas duas sonoridades, criadas para serem panos de fundo, aqui são usadas simultaneamente e competem por atenção do espectador, fazendo com que você se identifique ou se torne muito confuso sobre esse processo. Sobre qual das impressões se terá, vai depender, na verdade, do arcabouço existencial a que o próprio espectador poderá recorrer para formular esse encontro artístico e político com a própria subjetividade.

(Rogério Henrique Gonçalves)

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *