O DIA DE JERUSA

Solidão, sensibilidade e raça

Exibido no programa Mulheres Negras 2: Identidade Polifônica, a produção paulista “O Dia de Jerusa” aborda a solidão da mulher negra com uma sensibilidade cotidiana que mora nos detalhes. Dirigido por Viviane Ferreira, o filme narra a história de Jerusa, uma senhora que está fazendo os preparativos para seu aniversário de 77 anos, quando recebe a visita de Silvia, uma pesquisadora de opinião que aplica questionários sobre sabão em pó. A pequena visita, estimada para durar apenas 15 minutos, se estende ao longo da narrativa, quando o encontro das duas faz emergir as memórias de um passado translúcido da mais velha.

O que poderia desaguar em um curta de sentimentalismos, sobre a solidão da velhice de uma protagonista negra, desvia sua trama para se apegar a passagens que expressam a melancolia de um modo bucólico, tratando o aniversário de Jerusa com uma leveza cinematográfica emotiva, porém sem se desviar das questões abordadas e deixar sua essência no ostracismo.

Todos os atores que aparecem na tela são negros. Desde Léa Garcia, que faz o papel da protagonista, até coadjuvantes que não apresentam fala alguma. Isso faz emergir uma questão vital para o programa em que o filme é exibido. Mulheres Negras tem curadoria das próprias realizadoras dos filmes, que julgaram que suas obras não haviam circulado o suficiente.

“O Dia de Jerusa” é um curta de 2014 que ganha nova visibilidade no 28° Festival Internacional de Curtas Metragens de São Paulo, fazendo com que suas questões sensíveis entrem em voga na discussão sobre mulher e raça.

Embora o filme de Viviane Ferreira exagere um pouco no pedantismo do roteiro, buscando desanuviar a questão abordada com passagens que tratam a simplicidade com uma obviedade desconcertante, “O Dia de Jerusa” ainda consegue comover, talvez graças à atuação emotiva de Léa Garcia, que expressa uma melancolia implícita na simplicidade de seus gestos, ou talvez graças ao modo com que a diretora explora o peso da solidão, com a leveza de uma tarde repleta de bolos e devaneios sobre a vida.

(Gabriel Faustino)

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